Nike Air Force 1 – Relembrando Um Pouco Da História Por Trás Do Mito

04 dez 2015

Trinta e três anos e mais de duas mil edições diferentes depois de lançado, já não há mais espaço para dúvidas de que o AIR FORCE 1 é um dos mais importantes modelos de toda a história da indústria de calçados esportivos.

O tênis nasceu no basquete e, desde 2012, a NIKE vem usando o mês de dezembro para festejar o seu aniversário. Por isso, preparamos um post especial, que relembra um pouco da trajetória desse que virou símbolo das ruas nova-iorquinas e já foi cultuado nas mais diversas oportunidades.

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[title maintitle=”O NASCIMENTO” subtitle=””]

Até 1982, jogadores de basquete usam uma verdadeira gambiarra para minimizar o efeito dos impactos sobre seus joelhos e tornozelos. Sem calçados que oferecessem amortecimento adequado – estamos falando de uma era onde os astros das quadras eram nomes como ADIDAS SUPERSTAR, CONVERSE PRO-LEATHER, PUMA SUEDE e os NIKE FRANCHISE, BLAZER e BRUIN, dentre outros – o jeito era sobrepor camadas e mais camadas de meias, criando uma condição minimamente suportável para o jogo.

A NIKE já vinha lançando tênis com ar em suas entressolas, uma história que começou com o AIR TAILWIND, em 1979 e que ficava restrita ao universo da corrida.

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1979, a propósito, foi o ano em que um jovem designer, com experiências variadas, que iam da indústria automobilística aos eletrodomésticos da linha branca, foi admitido na empresa. Seu nome, BRUCE KILGORE e seu maior feito na companhia nasceu após ele ter assumido um projeto cuja principal missão era transpor a tecnologia de amortecimento à base de ar das pistas de corrida para as quadras de basquete.

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O resultado desse projeto é o AIR FORCE 1 que conhecemos hoje, mas quando KILGORE assumiu a missão, que já existia e era liderada por outro designer, o caminho adotado, segundo executivos da época, poderia ter nos levado a um modelo que mais parecia o gorducho mascote da (fabricante de pneus) Michelin. Que bom que não rolou.

 

BRUCE recomeçou do zero, até que em 1982 foi anunciado ao mundo o AIR FORCE 1, um tênis que ia contra todos os padrões estéticos estabelecidos para os calçados de basquete da época e que, além de trazer o tão comentado amortecimento à base de ar, ainda tinha a entressola mais alta já vista em um modelo esportivo, além de um cabedal de cano alongado, arrematado por uma tira de velcro – quase um cinto – que abraçava a região acima do tornozelo dos jogadores, prometendo-lhes a estabilidade nunca antes conseguida.

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Mas engana-se quem pensa que o sucesso do AF-1 foi imediato.
Sabendo que o visual não convencional do modelo (mais para uma bota de montanhismo do que para um tênis “comum”), dotado de tantos atributos técnicos que era preciso um manual de instruções para acompanhá-lo, poderia não convencer de cara, a NIKE tratou de imaginar uma estratégia de divulgação que, ao mesmo tempo em que promovesse o novo calçado, lhe daria o respaldo técnico necessário para que se dissipassem quaisquer dúvidas sobre sua funcionalidade, antes mesmo que elas aparecessem.

 

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O centro desse plano, ao invés de anúncios mirabolantes em TV, revistas e jornais, foi a escolha de seis promissores talentos da NBA, que viraram embaixadores da novidade. Eram as quadras que dariam a chancela técnica de que precisava o AF-1 e foi exatamente nas quadras onde o seu legado começou.

 

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Enfileirados em uma foto clássica, feita na pista do aeroporto John Wayne, em Orange Country, Michael Cooper, Calvin Natt, Jamaal Wilkes, Bobby Jones, Moses Malone e Mychal Thompson chamavam atenção pela vestimenta de astronauta, formada pelo macacão branco, com logo da NIKE gigante posicionado no peito, adornado por tiras metálicas, estrategicamente posicionadas nas golas, nos cintos e nos tornozelos, evocando uma das inovações técnicas do novo tênis: a famosa tira de velcro.

 

[title maintitle=”CINTO DE UTILIDADES” subtitle=””]

Batizada em seu manual como “Cinto Proprioceptivo”, a tira de náilon e velcro foi desenhada de modo a firmar a base da tíbia e da fíbula, evitando os deslocamentos laterais, tão comuns (naquela época, muito graças à popularidade dos canos baixos) quando se mede mais de dois metros de altura e pesa-se bem mais do que uma centena de quilos e que são responsáveis pela maioria das lesões de tornozelo.

Esse suporte extra contava, ainda, com o auxílio dos cadarços de altura regulável, imaginados para atender tanto os adeptos do estilo mais ‘certinho’, quanto os que preferiam um pouco mais de mobilidade, abrindo mão dos últimos pares de passadores.

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Num futuro nem tão distante, essa mesma tira de velcro ainda representaria um dos ícones de estilo do AIR FORCE 1: deixá-la solta, caída pelo calcanhar, era quase como mudar uma chave imaginária entre “quadra” e “rua”.

Além da firmeza, promovida pelo cabedal, o AF-1 prometia mais tração e aderência ao piso e o responsável por esse quesito era o desenho de círculos concêntricos do solado, projetado para se obter um travamento satisfatório nos deslocamentos laterais e antero-posteriores, sem comprometer a agilidade requerida pelos pivôs em seus movimentos.

Era mais uma tentativa de se evitar lesões de joelhos, tornozelos e ligamentos o que, junto com os 30% de amortecimento extra, prometidos pelo sistema a ar, fazia do AF-1 a “escolha perfeita para treinos e competições”, ainda segundo o seu nada modesto manual.

 

[title maintitle=”ILUSÃO DE ÓPTICA” subtitle=””]

NikeAirForce1_FinalIlustração por Gui Soares a.k.a. I Chase Balloons

Mesmo antes do seu lançamento, ainda na fase concepção, BRUCE KILGORE já havia se antecipado a uma possível rejeição desse visual tão pouco ortodoxo (para os padrões da época) do AIR FORCE 1 e criado artifícios de design que disfarçassem alguns dos pontos mais polêmicos do novo tênis.

Um deles, certamente, era o conjunto solado mais entressola, que, com sua polegada e meia de altura, poderia chamar atenção negativamente, por ser o mais rechonchudo já visto, até então. A altura se justificava pela necessidade de abrigar bolsas de poliuretano, recheadas de ar, e borracha, mas era necessário um disfarce para que um solado tão gorducho não afugentasse consumidores acostumados aos modelos planos, quase rasteiros, da época.

A solução encontrada por BRUCE passava por dois truques de óptica: o primeiro deles conseguido pelo tom mais escuro do solado dentilhado, cuja fronteira com a entressola era bem demarcada, criando dois blocos distintos. O segundo acabou se revelando quase que um anúncio ambulante: uma listra horizontal, que começava do calcanhar e ocupava pouco menos de um quinto da entressola, era cortada pela palavra AIR, como que gritando ao mundo “ei, tem ar aqui dentro e isso vai fazer desse tênis o mais confortável que você já usou para jogar basquete!”.

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Visualmente, e de uma maneira geral, o AIR FORCE 1 era um tênis de cabedal simples, com painéis suficientes para cumprir as funções a que se propunha, mas sem exageros de cores ou arroubos criativos de materiais – exceto pelo painel central das laterais, onde o couro branco dava lugar ao mesh cinza, material considerado menos nobre e, por isso mesmo, visto com certa reserva pela própria NIKE, que precisava justificar o preço (mais alto) cobrado pelo tênis nas prateleiras.

Funcionalmente, a escolha se explicava pela leveza e maleabilidade do mesh, quando comparado ao couro disponível, quase sempre grosso e pesado. Aos olhos do departamento comercial, entretanto, era exatamente um cabedal robusto, todo em couro, que validava o preço acima da média.

Engraçado que foram exatamente esses elementos mais polêmicos, em 1982, os responsáveis por fazer do AF-1 um tênis único, de personalidade forte, que influenciou dezenas de outras marcas e modelos lançados nas décadas seguintes. A japonesa BAPE, com seus Bapesta, vinte anos depois, que o diga.

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O último desses elementos tão distintos é o conjunto de furos localizados nas áreas sobre os dedos. Em número exato de 34 e funcionando como área de ventilação, eles chegaram a não existir nas primeiríssimas versões, hoje conhecidas como AIR FORCE ZERO, mas logo ganharam a simpatia do mercado e virarem mais uma das marcas registradas do tênis, junto com as estrelas esculpidas na borracha do solado que emergem da região anterior.

Estabelecido nas lojas e consagrado nas quadras, o AIR FORCE 1 começava a cumprir seu ciclo de vida útil de aproximadamente dois anos e a NIKE preparava seu sucessor natural – o AIR FORCE 2 até chegou a existir e ainda ganha relançamentos periódicos, mas nem de longe conseguiu acompanhar o sucesso do irmão mais velho – quando a nossa história ganha contornos inusitados.

 

[title maintitle=”OS TRÊS AMIGOS ” subtitle=””]

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nike-air-force-1-sbr-feature-11Sem ressentimentos ou rancores, o tênis simplesmente cumpriria uma trajetória que parecia natural: lojas, lançamento, promoção e vendas. A fabricante recuperaria seu investimento e lucraria (muito!), reinvestindo parte da quantia em pesquisas de materiais e inovações técnicas que, invariavelmente, dariam origem a uma nova geração, ou, quem sabe, a um modelo completamente novo.

 

Eis que entram em cena personagens inesperados que alterariam completamente o curso da nossa história: verdadeiros viciados em AIR, que adotaram o AIR FORCE 1 como calçado oficial e que impediram sua extinção. Clientes de três lojas situadas na região de Baltimore (Cinderella Shoes, Downtown Locker Room e Charley Rudo’s Sport), que fizeram com que esses comerciantes se comprometessem a comprar, pelo menos, 1200 pares de AIR FORCE 1 (de cada cor) para que a NIKE não tirasse o modelo totalmente de circulação.

 

O trio de empresários, que entrou para a história como “Os 3 Amigos”, ganhou a companhia de mais duas lojas localizadas na Philadelphia e uma última na cidade de Nova York, chamada Jew Man’s e localizada na periferia da cidade.

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A partir daí, os endereços dos “3 amigos e seus compadres” eram os únicos lugares, em todos os Estados Unidos, onde se podia comprar pares novos de AIR FORCE 1, em cores simples, mas que conquistavam cada vez mais a geração que crescia jogando basquete na rua e acompanhando a evolução do movimento hip-hop.

 

As novas cores eram vendidas mensalmente, e inspiraram a criação do pack COLOR OF THE MONTH, que tem mais um representante disponível no Brasil a partir desse final de semana.

 

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Era a primeira vez que a manifestação espontânea de consumidores, intermediada por sua ligação mais primária com as grandes corporações, os lojistas, tinha como resultado o que se viu: o AIR FORCE 1 não somente continuava a ser fabricado, como as lojas, que insistiram em vendê-lo, quase que por encomenda, simplesmente não conseguiam atender a demanda.

 

A propaganda formal em torno do tênis era zero e àquela altura o mercado para basquete já via surgir o fenômeno Michael Jordan, com seus JORDANS I e II (projetos dos quais BRUCE KILGORE também participou) além de DUNK, TERMINATOR, BIG NIKE e outros modelos que faziam uma corrente forte e contrária ao estilo do FORCE – que sobreviveria para entrar para história não mais somente como um ícone das quadras, mas como um símbolo das ruas, a quem deve, literalmente, sua sobrevivência, mais de 30 anos depois.

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Cantado em prosa e verso vezes suficientes para preencher um álbum completo e visto como um dos mais importantes símbolos da cultura norte-americana, o AIR FORCE 1 também reserva um capítulo especial para o Brasil em sua trajetória…

 

[title maintitle=”AIR FORCE 1 X BRASIL” subtitle=””]

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Por cinco vezes o Brasil foi tema de edições temáticas do AIR FORCE 1.

 

As duas primeiras saíram em 2006, na época da Copa do Mundo da Alemanha, uma delas com as cores da nossa bandeira e a outra fazendo referência ao jogador Ronaldinho Gaúcho.

 

A terceira saiu em 2010, durante a realização do primeiro WORLD BASKETBALL FESTIVAL, em Nova York – e nós estávamos por lá, para conferir tudo de perto.

 

 

 

 

 

 

Ilustração: Rozmowa

 

A quarta veio em 2011, junto com um manifesto chamado “É POSSÍVEL”, que falava sobre superar adversidades por meio da junção de esporte, arte e cultura de rua.

 

A última delas chegou em 2013, dentro de um pack que reunia duas edições atualizadas do modelo – LUNAR FORCE 1 e AIR FORCE 1 DOWNTOWN – mais uma edição tradicional. O trio fazia referência às festividades de réveillon, à tradição do branco e trazia grafismos alusivos aos povos que colonizaram nosso país.

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Mas essa é uma história que continua a ser escrita e nós estamos aqui, atentos, acompanhando tudo de bem perto.

 

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